Adquirir o gosto pela leitura. Ler por prazer. Conhecer o mundo pela literatura. Essa é a realidade de cerca de 30 crianças que, diariamente, dividem um pequeno, mas rico espaço literário no Shopping Popular da Ceilândia.
O projeto Roedores de Livros é o responsável por atrair essas crianças à literatura infantil. Idealizado e coordenado por Ana Paula Bernardes e mantido por ela e seu marido Tino Freitas, o espaço existe há oito anos e há três ocupa uma pequena sala do shopping popular.
Ana Paula é formada em Artes Plásticas, mas sempre trabalhou na área de educação, na formação de professores. O projeto surgiu com uma ideia inovadora em Brasília. A metodologia também já estava definida e a chamada “mediação de leitura” ainda não era conhecida. Este é o diferencial do lugar, pois, além de permitir que a criança crie o interesse pela literatura sem a obrigatoriedade imposta pelas escolas, ainda desenvolve a capacidade de reflexão e diálogo entre elas.
Ana Paula Bernardes é a idealizadora do projeto
O interesse pela literatura é a mudança que mais se nota. As leituras trazem às crianças assuntos de todas as áreas, garantindo diferentes conhecimentos de forma leve e descontraída. Elas escutam as histórias e participam, aprendendo sem perceber. Esta é uma das propostas do Roedores de Livros: fazer o contrário do que se faz na maioria das escolas. “A leitura aqui é pra ser livre, não é uma forma de ensinar as crianças sobre algum tema”, afirma Ana Paula.
A biblioteca chama atenção por si só. As atividades e o espaço aconchegante são suficientes para atrair a atenção de crianças que se tornam leitores frequentes. Com as estantes cheias, que formam um acervo de quase três mil livros, as crianças se sentem em casa e têm a liberdade de escolher entre os autores e temas preferidos.
Em meio aos livros, meninos e meninas de quatro a 12 anos de idade, em geral, passam a se familiarizar com textos e imagens, sabendo diferenciar entre os autores e ilustradores. “O ilustrador Ivan Zigg é o preferido entre as crianças e elas sabem dizer de quem é só de olhar o desenho”, declara Adriana Bertolucci, coordenadora do projeto e mediadora de leitura. Entre outros ilustradores, Zigg já participou de atividades com as crianças do Roedores e deixou uma ilustração na parede da biblioteca.
Tino Freitas media a leitura no chamado Tapete Mágico
No Brasil, a média de leitura espontânea a partir dos cinco anos de idade é de 1,3 livros por ano. A média só aumenta devido à obrigatoriedade de leitura nas escolas, atingindo 4,7 incluindo os didáticos. Na pequena biblioteca criada por Ana Paula, a extrovertida Rahides Farias Lima, de 10 anos, vai contra esses dados e garante que lê de três e cinco livros por mês.
Todos os dias, enquanto seus pais trabalham no restaurante da praça de alimentação do Shopping, ela aumenta sua lista de leitura. Está entre as que mais leem na biblioteca e já sabe mostrar onde ficam os seus favoritos. “Antes eu só lia livro fininho, agora nem escolho mais pelo tamanho”, diz Rahides, mostrando o último volume que leu, “Como fazíamos sem…”, um livro que desperta a atenção da criançada ao mostrar como seria o mundo hoje sem algumas das invenções da vida moderna. Este já entrou para o grupo dos favoritos de Rahides.
Outra frequentadora assídua da biblioteca é Vitória Sammy Pereira. A menina, também de 10 anos, responde com firmeza, ainda que sem convicção formada, o que quer ser quando crescer. “Quero ser médica pediatra. Mas se não der certo, quero ser ou advogada ou veterinária. Jornalista também pode ser, mas menos”, fala animada e sem pausa ao lado da mãe, que trabalha em uma banca de roupas no Shopping.
Vitória é comunicativa e segura. Impressiona pela desenvoltura, pouco comum em crianças da mesma idade. Frequenta a biblioteca há quase cinco anos e vai todas as manhãs, e garante: “já li quase todos os livros, faltam pouquinhos”.
É aí que se nota o desenvolvimento cultural das crianças que têm acesso livre à literatura. Em publicações especializadas recentes, professores destacam que o hábito da leitura na infância, além de fundamental na formação do indivíduo, ajuda a despertar na criança o senso crítico, além de auxiliar o aprendizado. A linguagem e a literatura são fundamentais para o desenvolvimento infantil e fortalecem as tomadas de decisões.
Até o fim de 2013, o projeto Roedores não recebia qualquer apoio do poder público. “Conseguir patrocínio é muito difícil”, afirma Ana Paula, que lembra das dificuldades e burocracias impostas pelo governo. O projeto foi aprovado pelo Fundo de Apoio à Cultura (FAC), do GDF, como educacional, com responsabilidade social. O Roedores de Livros teve seu início no Açougue Cultural T-Bone, na 312 norte, como projeto voluntário e hoje, com o auxílio, mantém uma equipe de dois funcionários e três voluntários, não perdendo sua característica inicial.
O espaço fica no Shopping Popular da Ceilândia, na torre A. Funciona para o público de terça a sexta, das 9h às 17h e aos sábados de 9h30 às 12h30. Qualquer criança pode participar. Para levar livros para casa, a frequência deve ser contínua e é necessário um cadastro na biblioteca.
Para saber mais, acesse:
http://roedoresdelivros.blogspot.com
https://www.facebook.com/roedores.de.livros
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Luiza Antonelli é estudante de Comunicação Social pela UnB e mora em Brasília, e colaborou para o Imagina com essa história. O texto e todas as imagens são de autoria de Luiza.
One Reply to “Roedores de Livros” .
Show! projeto espetacular!
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